A Metade de Nós: As diferentes formas de lidar com o luto
“A Metade de Nós” já está em cartaz nos cinemas
“O que um pai se torna depois que um filho morre?”. Em certa altura, essa é uma das reflexões que “A Metade de Nós”, novo longa de Flavio Botelho, traz para o espectador.
E é curioso como esse questionamento nunca havia passado pela minha cabeça. Por que, em situações diferentes, já temos na ponta da língua qual “rótulo” atribuir. Usando os exemplos citados no filme, quando um cônjuge perde o seu par, chamamos de viúvo (a). Quando um filho perde os pais, órfão. Mas e quando um pai e uma mãe perdem seu primogênito ou demais herdeiros, como categorizar?
Em “A Metade de Nós”, Francisca (Denise Weinberg) e Carlos (Cacá Amaral) perdem seu único filho Felipe, depois do rapaz atentar contra a própria vida. Enquanto encaram essa nova e dolorosa realidade, o casal se separa e cada um, a seu modo, enfrenta a jornada do luto.
A Francisca de Denise Weinberg é uma grande muralha, concentrando toda a sua força na missão de descobrir o que realmente motivou a ação de seu filho. Mas, ao mesmo tempo, é nítido o quanto os sentimentos a sufocam levando em conta sua constante busca por oxigênio ou qualquer mínima brisa que possa adentrar por cada uma das janelas que faz questão de abrir em determinados momentos.
Por outro lado, o Carlos de Cacá Amaral fecha todas as janelas possíveis para que a memória de seu filho não se esvaia com o vento. Carlos prefere se ver preso a cada item, cada quadro, cada peça de roupa de Felipe. Diferente de Francisca, o homem não contem sua emoção diante do novo cenário, se permitindo sentir a dor que atravessa seu peito e externalizando-a sempre que necessário.
E, ao se mudar para o apartamento do filho, entra em cena o último elemento dessa história. Hugo, interpretado por Kelner Macêdo, é o responsável por trazer algumas viradas inesperadas na produção com um carisma muito bem vindo dentro de algo tão denso.
Com 1 hora e 30 minutos de duração, o filme dirigido por Flavio Botelho é de difícil digestão. Não apenas pelo principal fio condutor da narrativa, mas por que a montagem e o ritmo lento do longa também fazem com que esse efeito seja causado em quem está assistindo.
Acompanhar a jornada desse casal e entender como cada um lida com essa situação também é um desafio por que a personagem de Denise não foi criada para ser aquela que vai conquistar o espectador mas, conforme a narrativa avança, torcemos por ela com base na esperança de que ela não cometa algum ato que possa ser irreversível. Já Cacá, através de sua vulnerabilidade, nos aproxima um pouco mais e parece tornar qualquer proximidade bem vinda, sendo um contra ponto ideal para balancear o filme.
A disparidade entre os dois também contribui para demonstrar que é possível reagir de diferentes formas diante de tamanha dor, tornando válida toda forma de expressão. Apesar do casal de atores entregar em geral uma performance mediana, ainda assim é possível enxergar verdade em suas atuações.
A trilha sonora causa incomodo em alguns momentos por não conversar com o que está sendo mostrado em cena e algumas sequências eu considero desnecessárias durante a projeção, seja por serem longas demais ou fora de tom com o que está sendo desenvolvido, mesmo entendendo o propósito narrativo por trás delas.
Com uma cena final belíssima e cheia de significado, sendo este o único destaque para o trabalho de fotografia do longa, o nacional “A Metade de Nós” da Pandora Filmes traz a tona um assunto de extrema importância e que precisa ser ainda mais discutido na sociedade de forma responsável. Nesse sentido, essa produção é um ótimo exemplo para iniciar essa conversa.
Porém sabemos que, na maioria das vezes, a saúde mental da população não recebe a devida atenção e já passou da hora de mudarmos isso.
Texto Elaborado por Jamerson Nascimento.
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