Mitski Miyawaki e o melhor tipo de tristeza
A vulnerabilidade e sentimentalismo de Mitski, a artista que viralizou em trends tristes no TikTok
É de conhecimento geral que, quando uma música viraliza no TikTok, ela viraliza em qualquer outro lugar e, recentemente, várias trends dessa rede social tem chamado a atenção para uma artista muito particular, sendo duas delas muito marcantes. A primeira delas sendo a “Nobody”, onde os tiktokers aparecem correndo de tópicos específicos ao som da música que leva o mesmo nome da trend.
A segunda, talvez a mais popular, é a “Everybody Do The Mitski Shuffle” (Que traduz para algo como: Todo mundo faça o mix da Mitski), onde ao fundo toca a música I Bet On Losing Dogs enquanto uma situação triste ou traumática da vida do criador do vídeo é contada na tela. O que essas trends tem em comum? As duas trazem músicas da mesma cantora, acompanhadas de situações intensas e, quase sempre, tristes. E essa escolha não é aleatória.
Mitski Miyawaki é uma cantora e musicista nipo-americana do gênero indie. Seu sucesso vem de bem antes do TikTok, já que ela é dona de sucessos como Your American Girl, considerada a 7º melhor música da década pela Pitchfork, e do álbum Be The Cowboy, considerado um dos melhores de 2018. Porém, o que chamou a atenção de volta para ela em 2020 e 2021 nas redes sociais foi a profundidade de suas músicas e, em especial, o sentimento que ela coloca em seus trabalhos. Não é coincidência que suas músicas estejam sendo usadas em trends com temática mais pesada e menos positiva.
Mesmo tendo iniciado sua carreira a alguns anos, o primeiro grande sucesso de sua carreira foi o álbum Puberty 2, lançado em 2016. Por ser uma musicista em um gênero muito popularmente dominado por homens brancos, Mitski, enquanto mulher e amarela, foi vista como um diferencial, a pessoa que “salvaria” o indie rock e faria a diferença entre os demais. Todavia, ela explica em entrevista que, em boa parte desse álbum, ela não trazia nenhum sentimento às músicas, pois ela estava tentando produzir hits ao invés de músicas com propósito. Felizmente, dali para frente ela recupera sua vulnerabilidade, que fica visível nos álbuns seguintes, cada vez mais parecidos com ela e com suas particularidades.
A verdade é que Mitski é sim diferente do restante dos artistas da mesma categoria, e essa afirmação não tem como objetivo diminuir nenhum outro artista, mas temos a tendência de ignorar a individualidade na música ultimamente, e encaixar todo mundo em caixinhas específicas de gêneros musicais. Mitski, assim como outros antes e depois dela, é uma artista indie, mas não quer dizer que ela seja como a Phoebe Bridgers, por exemplo, que é do mesmo gênero musical.
E o que faz Mitski ser diferente é a capacidade de consegue passar um sentimentalismo muito singular em suas músicas. Mais especificamente, suas músicas possuem uma melancolia tão profunda que não consegue ser negativa. Você ouve, sabe que é triste, mas a música não te deixa triste propriamente, se você focar bastante nela, ela te causa uma sensação de êxtase, quase como uma meditação involuntária. Parece exagero, mas garanto que não é.
Podemos tirar como exemplo a música I Bet On Losing Dogs, bastante popular atualmente. A música fala sobre relacionamentos sem reciprocidade e fadados ao fracasso. A metáfora em “apostar em cães perdedores”, presente no título da música, é uma referência a confiança aplicada em um relacionamento que sabemos que irá falhar e dar errado, mas insistimos, na esperança de que o resultado seja diferente, mesmo sabendo que é só um ingresso para ver de camarote um desastre que envolve nossos próprios sentimentos. E, mesmo sem saber disso antes de ouvir a música, você consegue sentir tudo de dentro pra fora quando ouve ela cantar: “My baby, my baby. You’re my baby, say it to me. Baby, my baby . Tell your baby that I’m your baby”. Não é só a letra, é a voz, o tom, o conjunto todo.
Além dessa, temos também First Love / Late Spring, do álbum Bury Me At Make Out Creek, uma música que apresenta a vulnerabilidade em sua pior e mais intensa forma. A música fala sobre as expectativas e experiências fantasiosas de um primeiro amor, transitando rudemente para a pesada realidade de um relacionamento real. Ela começa na inocência e esperança de que tudo vai ser perfeito, até chegar na parte difícil, e toda a esperança parecer de uma ingenuidade infantil.
Essa canção, em especial, acompanha a frase em japonês: 胸がはち切れそうで (Mune ga hachikire-sōde), que significa “Parece que meu coração vai explodir”, fazendo referência à sensação arrebatadora que temos quando confrontados por uma realidade que não esperamos. Esse pequeno traço de um idioma completamente diferente do restante da música adiciona profundidade ao significado, já que Mitski tem origem japonesa.
Quando digo que a tristeza apresentada nas músicas de Mitski não são negativas, é sobre a sensação de ouvir a música. O comportamento normal ao ouvir uma música triste, é ficar triste com ela. Talvez chorar um pouco. Com ela, não é sempre assim. Com as músicas dela, por mais que sejam tristes, você não necessariamente vai sentir um sentimento ruim, de ansiedade e descontentamento. Ela consegue fazer com que a experiência de a ouvir seja mais profunda que isso. Mitski é uma das cantoras essenciais para autodescoberta dos seus sentimentos, porque ela não canta, apenas. Ela ensina. Você quer ouvi-la, mas, mais que isso, quer escutá-la, aprender com ela.
Porque muito além do ritmo ou da linguagem, as mensagens de suas músicas são de uma originalidade ímpar, e é isso que a diferencia do restante.
Texto por Thais Moreira
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