Reencarnei como um vilão, a escória da escória, (“scum villain”) e um destino pior que a morte me aguarda, o que fazer?

The Scum Villain’s Self Saving System (no original: Ren Zha Fanpai Zijiu Xitong; numa tradução literal seria algo como “O sistema de autossalvamento de uma escória de vilão”) é uma light novel chinesa, do gênero danmei, escrita pela famosa Mo Xiang Tong Xiu. A novel traz aquele clichê de isekai que a gente adora, mas com uma pegada mais adulta e com um protagonista cheio de opiniões sobre sua “nova vida”.

Além desta obra, Mo Xiang Tong Xiu também já publicou outras duas obras, de maior sucesso e que inclusive tem resenhas sobre, aqui no nerd: The Grandmaster of Demonic Cultivation (Mo Dao Zu Shi) e Heaven’s Official Blessings (Tian Guan Ci Fu)- esse último é o favorito desta que vos fala.

Shen Yuan era um leitor assíduo (fã e hater) da famosa web novel “Proud Immortal Demon Way” e vivia criticando as escolhas do autor para a história, mas acabou morrendo cedo e fim. Ou seria o fim, se o mesmo não tivesse sido transportado para o universo da novel, como ninguém menos que Shen Qingqiu, um belo professor de cultivação, de fama conhecida e… o grande vilão da história que encontrou seu fim pelas mãos do protagonista, da pior forma possível.

Apesar de ser poderoso, Shen Qingqiu acaba punido por seus crimes, não com a morte, mas tendo seus membros arrancados e sendo transformado num “palito humano” por Luo Binghe, um meio humano/meio demônio que sofreu como seu aprendiz, mas acabou se tornando um protagonista forte, cruel e dono de um harém digno de inveja pelos leitores.

Shen Qingqiu, agora, tentará fazer de tudo para evitar esse final, mas está refém do sistema que o trouxe para esse universo, de forma que não pode fugir do personagem e simplesmente não ser o vilão, senão perde pontos e, consequentemente, a vida. 

O sistema em questão parece uma espécie de inteligência artificial que funciona como um jogo, de forma que Shen Qingqiu pode consultá-lo a qualquer horário, precisa participar das quests ao longo da história, pode perder ou ganhar pontos de satisfação e desbloquear itens. Todavia vamos percebendo que o sistema é meio sacana na distribuição dos pontos, vira e mexe veremos o jovem batendo boca com ele e criticando os rumos da história.

“No momento em que Shen Qingqiu expressou a menor gentileza, ele limpou de sua mente todo o dano anterior que havia sofrido e aceitou Shen Qingqiu nas profundezas de seu coração sem um momento de hesitação. Então Shen Qingqiu, sem saber, esmagou aquele coração de vidro dele, e Lou Binghe pegou os pedaços um por um como uma jovem esposa abusada, colando-os de volta juntos - Ao que ele devolveu a Shen Qingqiu, cheio de esperança e expectativa, apenas para ser esmagado novamente, depois colado novamente, etc…”

E que rumo essa história tomou, senhoras e senhores, afinal, eu disse que é um danmei. Em suas tentativas de evitar que o protagonista o odeie, isso acaba tendo o efeito maior do que deveria, e, ao invés de odiá-lo, o protagonista começa a nutrir sentimentos ainda desconhecidos por seu professor. É adeus para o Luo Binghe, mulherengo e seu vasto harém de mulheres, agora que seus interesses são outros. Mas isso só nós percebemos, o Shen Qingqiu mesmo demora muito para perceber o desenrolar das coisas e só fica iludido vendo os “futuros interesses amorosos” de Binghe.

Como um perfeito escroto, o Shen Qingqiu original, além de fazer a vida de seu pupilo um inferno, ele também assassinou seus irmãos do clã, por motivos fúteis, além de assediar sua pupila e interesse romântico de Binghe na obra. Felizmente, dessa vez ele conseguiu consertar esses problemas e se tornar um ótimo exemplo de cultivador, exceto pelo ponto-chave da obra, onde ele foi obrigado a empurrar Binghe no abismo que o levou direto ao inferno.

Mas que história é essa? 

Pois é, como meio demônio, Luo Binghe não morreu, mas treinou para se fortalecer e retornar ao mundo humano, para encarar Shen Qingqiu que o traiu. Não entendam errado, Qingqiu não queria fazer isso, mas era o tipo de desenvolvimento que o sistema não permitiria, de forma que ele teve que fazer isso, e agora terá que aceitar as consequências de alguém que foi traído e teve seu coração partido por seu professor.

"Você menospreza protagonistas masculinos gays? Escritores puros, obras de arte, todos gostam de retratar gays. Veja, Brokeback Mountain, Bai Xianyong, Farewell My Concubine, clássicos, famosos, todos gostam de escrever sobre gays. A literatura pura privilegia os gays, sabe? !"

Como podem ver, são várias reviravoltas e vocês nem chegaram a conhecer o “vilão” dessa nova versão de “Proud Immortal Demon Way”, mas não vou entregar spoilers aqui. Apenas saibam que tem muito mais do que consigo resumir aqui, além das cenas de fazer o coração bater mais forte, entre Luo Binghe e She Qingqiu (se é que vocês me entendem).

The Scum Villain’s Self Saving System foi a primeira obra da autora Mo Xiang Tong Xiu, de forma que não é a mais famosa e podemos ver indícios de ideias que ela utilizaria em suas futuras obras (exemplo, a cena do caixão). Não é um marco literário e tem algumas cenas que admito que não pegaram bem, além de o protagonista Binghe não ser o tipo ideal de homem, sendo possessivo e manipulador, um tanto masoquista também. 

Todavia, é uma leitura engraçada em vários momentos, principalmente pela personalidade de Shen Qingqiu. A obra, infelizmente, não possui tradução para o português (pelo menos, legalmente), mas foi adaptada para o inglês, pela editora Seven Seas. Os 4 volumes podem ser adquiridos na Amazon (o preço é um pouco salgadinho, admito), tanto impresso, quanto em e-book (mas para e-book precisa trocar o país de residência no sistema, senão não dá para comprar, por motivos de não sei, idiotice deles). 

Além disso, a obra também foi adaptada para uma animação em 3D, que traz a primeira fase da história, até a queda de Binghe no abismo, com algumas censuras, afinal, China proíbe conteúdo LGBTQIAP+ na TV. Essa animação não está em nenhuma plataforma oficial por aqui, então vai ser uma pequena exploração para quem quiser assistir.

Por: Letícia Vargas